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sábado, 24 de setembro de 2011




MINI TEXTO PARA TEATRO

“BOTICA DO CÃO”
   


PERSONAGENS:                        ATORES DA 1ª MONTAGEM
 Mariquinha                                     Liliane Alves
 Cão (disfarçado)                            Allan Shimith
 Cardinho                                        Edenildo Guedes


CARDINHO: Raiou o sol, se esconde a lua para presenciar mais uma das aventuras cozidas, pelos causos vindos da terra do tiquinho; um tiquinho daqui, um tiquinho de lá! Trazendo um santo milagreiro como escudo e o brasão do santo papa lacrando toda a sua devoção de um povo sofrido e cristão. Terra essa de uma gente castigada, mas otimista, perseverante e guardiões das virgens da purificação,  lavrando cada destino no caminho da religião. Vamos  nessa linda noite vivenciar uma pequena história nessa terra de minhas andanças, história essa tecida pela minha família e que tem como protagonista a minha tia Mariquinha, moça velha de caritó, mas uma beata de devoção, carola daquelas doentes que morrem de medo do cão. Um certo dia, como Jesus Cristo, ela também se encontrou com o tinhoso, foi atentada, escritinho o Salvador.  Se ela se salvou? Bem, vamos ver como tudo se passou!

 MARIQUINHA: Valei-me minha virgem Maria; Nossa Senhora da Conceição! Meu santo Expedito e o coração de Jesus menino e salvador, bento e santificado pelas cinco chagas da crucificação. Nosso Senhor todo poderoso me livra de todos os males assim como todas as  rezadeiras e benzedeiras daqui desse sertão. Viche, que hoje eu estou com o...

TODOS: (ocultos como sugestão) Com o cão!

MARIQUINHA: É a mãe! O cão é a mãe de vocês que não sabem dar educação, cambada! Se bem andam, elas devem estar fazendo outras misérias iguais a vocês! Seus infelizes das costas ocas, do estopo balaio na quinta feira santa! Judas! O filho do tinhoso é a mãe!.. Meu Jesus me martiriza com o espinheiro sagrado, me castiga nas ladeiras com um balaio de batata na cabeça, me joga Senhor nas paredes carrapichentas da lamentação, que eu lave todas as igrejas, catedrais e conventos, que eu separe todo o joio do trigo, que eu traga em caneca de alumínio todo o mar para o sertão,  mas se é uma coisa que eu não suporto mais é esse povo sem seu pai no coração, meu Jesus Cristo, me frechando que é uma danação. Arranca Senhor de mim essa aperreação.

CARDINHO: Bença tia?

MARIQUINHA: Cardinho!

CARDINHO: Quem fala sozinha ta falando com o cão, tia Botica.

MARIQUINHA: Cardinho!!

CARDINHO: Quer dizer; tia Mariquinha.

MARIQUINHA: Até tu Cardinho, sangue do meu sangue, alma da minha salvação, meu sobrinho preferido, até tu meu Cardinho sagrado?

CARDINHO: Sabe como é tia, o povo fala tanto que eu termino acostumado com esse nome. Desculpa.

MARIQUINHA: Quem? Eu quero nomes! Quem tanto nessa cidade me chama de... Você sabe de que, Cardinho? 

CARDINHO: Botica do cão, tia?

MARIQUINHA: Não precisa ta repetindo! Mas me diga meu sobrinho querido quem tanto me chama por este apelido horroroso para que eu possa processar, mandá-los para a cadeia, queimá-los na fogueira sagrada, me diga sobrinho da purificação.

CARDINHO: Pois tá ruim pra a senhora porque é toda a cidade. É mais fácil eu lhe dizer quem não diz.

MARIQUINHA: Ai meu Deus do céu, da terra e do mar, o que irei fazer meu pai todo poderoso? Socorre essa sua filha nesse momento de aflição, assim como socorresse Maria Madalena, tende piedade de sua filha amada e devota, fervorosa e ralada feita milho pra canjica na fé, me mostra uma saída meu pai! Estou clamando igual a Moisés! Me envie uma luz, um sinal!.. Nada? Não estás escutando Senhor? Quem irá me ajudar se não a vossa misericórdia? Quem irá me tirar dessa danação?

CÃO: Eu!

MARIQUINHA: Ai meu Deus... Que  calor me bateu agora, Senhor!...  Que negão!

CARDINHO: É nessa hora que a história da minha tia começa a virar folheto de cordel, de uma forma engraçada e jamais vista por esse sertão. Espia minha gente que grande tentação; a pobre da minha tia tão enfiada dentro das orações que esqueceu de se casar, pois homem ela só tinha contato com os meninos, o padre e o sacristão, nunca tinha visto um homem garboso feito esse negão. Os homens que ela conhece são os que eu já falei e os poucos velhos daqui da região. Tia mariquinha sempre foi uma beata prendada, muito dedicada e nunca deu um beijo ou um amassão. E só um inimigo declarado ela tem; o cão.

CÃO: (canta e dança sensualmente para Mariquinha).

CARDINHO: Muito desconfiado eu fiquei com esse negão; o perfume dele tem cheiro de enxofre e tudo o que é de moça desse lugar doidas para com ele namorar, mas os olhos dele não querem saber de outra virgem a não ser a minha tia Mariquinha que é mais conhecida por Botica e que é feia feita uma assombração.

MARIQUINHA: (Canta e dança hino religioso).

CÃO: Vim lá das profundezas dos cafundós só a rosa mais cheirosa encontrar, na cidade do sol nascente, onde mora a mais bonita donzela desse lugar, vestida de renda purificada, perfeita feito uma cinderela que se esconde nos afazeres da lida, mas resplandece como uma aurora ou uma flor em plena primavera. O meu destino me desafiou essa flor encontrar e aqui estou aos seus pés, a sua mão querendo beijar, me entregar de corpo inteiro e eme rainda da minha vida te transformar.

MARIQUINHA: Não sei o que comigo está acontecendo, mas não consigo em outra coisa pensar e os meus olhos estão hipnotizados por esse homem que está a me cortejar. Até os nomes dos Santos esqueci,  nada de reza eu sei pronunciar. 

CÃO: Você fez um pedido? 

MARIQUINHA: Sim, claro. Pedi a Deus uma ajuda...

CÃO: Ele não te atendeu, mas eu estou aqui, em forma de anjo para te salvar!

MARIQUINHA: Você falando assim, garboso negão, tá me deixando toda molinha. Aí,  meu Deus, o que fazer?

CÃO: Não bote esse homem no meio de nossa prosa.

MARIQUINHA: Quem, Deus?

 CÃO: Porque aqui eu to cumprindo a minha missão e eu não quero que ele atrase a consumação, pois estou aqui para conquistar o seu coração e logo ele devorar, ter você todinha pra mim, até a sua alma eu me apossar.

MARIQUINHA: Que calafrio, que mau agouro que agora vim sentir, é como se o tinhoso tivesse aqui por perto querendo me possuir. Todo o meu corpo está trêmulo feito o badalo do sino daqui, tô sentindo todo o meu corpo pegar fogo, feito fogueira de São João. 

CÃO: Vem beata linda, donzela da minha salvação, vem pra o colinho do papai fazer a última oração, vem confessar seus pecados, pois quero té dar o meu perdão.

CARDINHO: Aí tem um erro e eu não sei o que é, mas tenho que salvar a minha tia Mariquinha e já sei o que fazer! Ele sei que  não poderei vencer, mas a minha tia eu bem sei como resolver.

CÃO: Senta minha beatinha em meu colinho e deixa a tua boca a sua alma sugar.

MARIQUINHA: Safadinho!  Mal me conhece e já tá querendo me possuir. Vá com calma que o andor é de barro e essa aqui nunca vi um santo subir.

CARDINHO: Botica do cão!!!

MARIQUINHA: É a mãe!

CARDINHO: Ele desapareceu.

MARIQUINHA: Quem?

CARDINHO: Ninguém tia, deixa pra lá.

MARIQUINHA: Vou denunciar a sua  mãe a polícia,  ao padre, ao escambal, aos quatro canto do mundo pela mal criação. Me respeite Cardinho que eu ainda sou a sua tia. 

CARDINHO: Mais tia, mãe é sua irmã e a senhora não pode denunciar. 

MARIQUINHA: Pode ser quem for e principalmente a sua mãe por não ter dado os devidos corretivos educacionais em você. Eu te desconjuro Cardinho.

CARDINHO: E o que foi que eu fiz minha tia?

MARIQUINHA: Se arrependa Cardinho, se redima dos seus pecados ajoelhado ao pingo do meio dia sobre caroços de milho e só assim te aceitarei como um bom cristão.

CARDINHO: E eu pequei?

MARIQUINHA: Se ajoelha! Senhor, Deus pai todo poderoso, criador do céu e da terra, tende piedade desse pequeno pecador, desse inocente que acaba de começar a viver! Amém! Salve a alma dessa pequena criatura Senhor, sem eira nem beira...

CARDINHO: Espera lá tia, aí a senhora está apelando; posso não ser ninguém, não ter eira, mas as minhas beiras estão todas aqui.

MARIQUINHA: Não se entregue Cardinho! Resista! Não permita que o maldito tome posse do seu frágil corpinho meu sobrinho! Amém! Pelo poder de Deus pai; o espírito desse inocente não será tomado jamais pelo satanás!

CÃO: Me chamou?

MARIQUINHA: Que catinga danada de feijão queimado...

CÃO: Me chamou, linda donzela? Em pensamentos e palavras,  atos e omissões. 

MARIQUINHA: Meu pai me proteja, pois acredito que estou ouvindo a voz do desconjurado.

CÃO: O filho do tinhoso zambelê.

MARIQUINHA: Que nessa terra nada irá comer!

CÃO: Nem essa doce donzela? Estou atrás de você.

MARIQUINHA: Nem a... Negão! Que botico arregalado é esse?

CÃO: É para te ver melhor minha pura donzela.

MARIQUINHA: Que par de beiços é esse meu... Negão?

CÃO: É um sugador de almas minha tentação. Minha botica do cão.

MARIQUINHA: É a mãe!

CÃO: Nada poderá me impedir de sugar a sua alma e se tornarás para sempre a minha botica do cão! Você será a minha botica e eu sou a sua tentação! O cão!!!

CARDINHO: Tia Mariquinha se armou com um terço bento por Frei Damião e pôs uma mantilha preta das devotas da salvação e olhando compenetrada para o povo daquele lugar que estavam todos a observar pediu com toda fé ajuda para acabar com a sua maldição.


MARIQUINHA: Reconheço minha gente que servir a Deus é servir ao próximo e eu nada disso estava a fazer, ao contrário; trancada, só rezando, esquecendo-se do mundo e se achando a salva do lugar e sei que essa é a maior prova que Deus me enviou para que eu possa me transformar e ele mexeu com a minha maior fraqueza que é a enorme vontade de casar. Peço humildemente a todos que aqui estão que se armem comigo com a reza da salvação, eu aqui vou falando e vocês repetindo com toda fé e devoção.

CARDINHO: Antes da minha tia Mariquinha começar a orar, o tinhoso a sua roupa começou a tirar, utilizando as suas últimas armas para a alma da minha tia sugar.

MARIQUINHA: Fechem os olhos minha gente e não caiam nas armadilhas da tentação! Gritem bem forte o que aqui eu falar para esse infame nós expulsar: Sai!

CÃO: Arre! Dançei, pulei e nada. Cheguei a chamar esse tribufu aí de flor e esse é o pago de vocês?

MARIQUINHA: mais uma vez minha gente com mais força: Sai!      

CÃO: Ta bom! Eu já entendi bando de mal agradecidos. Ta aqui pra vocês!

CARDINHO: O povo derrotou o tinhoso do sertão e minha tia feliz foi agradecer a comunidade que unidos eles tem força para derrotar um batalhão e nesses agradecimentos a minha tinha encontrou um amor...

MARIQUINHA: (Com uma pessoa da plateia) Cardinho meu sobrinho amado, noivei e estou para casar com esse garboso rapaz que a minha mão ele insiste em desposar.

CARDINHO: Para a nossa pequena história terminar só está faltando o casal se beijar.

TODOS: Beija!!!


MACAÍBA(RN), 05 DE OUTUBRO DE 2000





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